A ave muda,
feita de papel
chora saudades
Watashi no amai Kaori,
私の甘いかおり,
Minha doce Kaori,
queria falar com você no seu idioma, mas minha limitação ficou apenas nas poucas palavras que me ensinou.
Na última segunda estive na rua em que moramos. Fui parar ali por acaso, na procura de um endereço e o aplicativo parece que seguiu meu coração e quando reparei – embora um pouco modificada – estava na esquina do lugar onde morei por tantos anos. No lugar da minha casa há um edifício enorme, a calçada alta onde sentei tantas vezes no fim da tarde nem existe mais. Tudo tão estranho.
Mas a casa que era sua ainda está lá… quase igual. As paredes em tons suaves de azul… Respirei saudades ali, Kaori e parece que o tempo voltou. Era quase noite e eu já não via mais o sol dourado… Ouvi vozes estranhas do lado de dentro da casa. Juro que pareceu a sua… mas, foi a minha imaginação que me pregou uma peça.
Ainda está lá a árvore que o Seiko plantou e ganhou galhos enormes. A cerca branca mudou de cor e já não há mais gerânios nas janelas. Uma cortina esvoaçava e vi vultos, ouvi risos e minha saudade encheu o coração de amor por você.
E há tanta vida em seu lugar, Kaori… olhando a ladeira que acaba na outra esquina – que era para onde eu deveria ir – pareceu ser seu vulto com seus passos desenhando nuvens no chão. Tantas vezes te esperei no pé dessa ladeira para te ajudar a carregar as sacolas de compras. Ali, lembrei-me de tudo que vivi… foi como se Colcha de Retalhos estivesse sendo exposto folha por folha, palavra por palavra. O livro, na lembrança e na pele que arrepiou.
Fui me afastando aos poucos e conversando com você as palavras dessa carta. Fui invadida por uma imensa gratidão e mais uma vez me senti inundada pelo seu amor. Foi como se um tsuru pudesse voar dentro de mim… foi como se mais uma vez Ana nos abraçasse em sua alegria contagiante. Foi como se Marte tivesse ao alcance das mãos.
Este é o meu livro, Kaori. Foi criado pelas mãos da Lunna Guedes, minha editora – ela soube captar o meu amor e transformar em um aconchego para aquecer os corações de quem o ler.
Quando sai de nossa antiga rua, rumo ao meu compromisso tantas lembranças me acompanharam… Programei voltar, Kaori e conhecer quem vive ali, no lugar que ainda guarda tanto de você. Prometo que assim que isso acontecer, volto a te escrever.
Um abraço de vento na asa de passarinho,
Mariana Gouveia
Agosto é o mês de tsurus e de Beda.
Participam junto comigo:
Lunna Guedes – Obdúlio Nunes Ortega – Darlene Regina – Mãe Literatura –
Suzana Martins – Roseli Pedroso