Helena,
Eu deveria te escrever com meu vestido de poás laranja e assim, atravessar esse oceano e te contar coisas do meu quintal. O sol do meio-dia se impõe e hoje, parece mais quente que os dias normais. O vestido dá lugar para o conjunto de short e camiseta e nem vou te falar sobre poás.
Ou talvez vá… a borboleta laranja que voa aqui, parece ter poás nas asas – claro que isso é imaginação minha – e veio essa semana toda. Lembrei-me de um poema de Graça Carpes: “Tenho o tempo das borboletas. Uma semana, é uma vida” e eu fico pensando se é a mesma que veio todos esses dias ou se a semana dela já passou.
Não sei se te contei sobre o vento morno daqui e se na densidade das horas a vida é igual para você. O calendário parece acelerado. Foi ainda a pouco que retirei a folhinha de ontem e o hoje já é quase amanhã. Será que passaremos a ter o tempo das borboletas? Amanhã já é dezembro, Helena! E daqui a pouco, já estarei escrevendo para o novo ano.
O dia ganha contornos laranjas no meu quintal e leio sobre pássaros em poemas que não escrevi enquanto meu pássaro de todo dia vagueia por aqui. Ele se coça e uma peninha se solta. Isso me dá uma ternura imensa. Lembro de você e do seu sorriso quando te conto histórias sobre ele.
Sabe, Helena, os meninos da rua de cima já correm atrás de pipas. Os cães latem enquanto um dos meninos tenta roubar a pipa do outro. Já fiz muitas pipas para eles em outros tempos. Até hoje, há um esqueleto de uma que fiz presa no fio de alta tensão.
As sombras já contornam o pé de ipê e já invade minha janela. Alguns raios do sol atravessam as telhas e formam uma luz difusa na minha cozinha. A vida tem essas coisas mínimas no dia da gente. Um voo de borboleta, um pouso de pássaro, uma nuvem em forma de coração, uma folha que cai e às vezes, nem reparamos nos instantes de ternura. Você tem reparado nas ternuras daí, Helena?
Um beijo meu,
Mariana Gouveia
Projeto Blogvember – Scenarium Livros Artesanais
Participam juntos comigo: Lunna Guedes – Obdúlio Nunes Ortega – Roseli Pedroso e Suzana Martins